Influência de George Orwell

A Influência de George Orwell na Música

Escritor britânico, famoso por seus romances distópicos, é um ícone da cultura pop e responsável indireto por inúmeras obras cinematográficas, literárias e musicais

Confira o vídeo que fizemos sobre o tema aqui

Cerceamento das liberdades, uniformidade social, vigilância e medo constante; são apenas alguns elementos comuns em um mundo distópico entregue por autores como George Orwell.

Se a utopia, antítese desse cenário, é o sonho inalcançável, um universo onde liberdades são cessadas e vidas pertencem a um tirano nos parece muito mais contemporâneo e realista, criando assim um cenário atraente para nosso pessimismo de berço.

A música sempre andou de mãos dadas com a literatura, mas é no universo distópico que as notas tocam nosso espírito e nos levam a esse mundo de submissão, onde a beleza não se faz presente, sua alma já foi vendida e a esperança foi rasgada e queimada.

Escritores como Aldous Huxley, Anthony Burgess, Ray Bradbury têm suas obras transcritas como inspiração para diversas músicas. Mas um em particular mantém ainda hoje seus títulos distópicos entre os mais influentes do mundo.

George Orwell

Eric Arthur Blair, mais conhecido como George Orwell, foi um escritor britânico que teve seu nome marcado pela constante e intensa oposição ao totalitarismo.

Orwell nasceu em 1903 e até o fim de sua vida em 1950, o autor produziu 6 romances. Mas 2 deles ganharam relevância no mundo e ainda hoje são mantidas como literaturas essenciais.

Animal Farm

George Orwell

“A revolução dos Bichos” (Animal Farm), escrito em 1945, é uma sátira que relata a corrupção e traição dos animais que lutaram juntos na revolução contra os humanos e, ao chegarem ao poder, instituem uma ditadura tão ruim quanto a anterior.

A história se desdobra vendo a esperança de uma sociedade mais justa morrendo a cada amanhecer, num sentimento de deslealdade em ver que aqueles que lutaram ao seu lado, hoje determinam o quanto você deve sangrar por eles.

O livro teve influência direta no décimo álbum de estúdio do Pink Floyd: “Animals”.

Pink Floyd
O clássico álbum do Pink Floyd “Animals” é uma releitura do livro de Orwell “A Revolução dos Bichos”

A capa em si já é uma obra distópica; escura, desoladora, sem presença alguma de vida. É possível extrair várias mensagens em um estudo de semiótica. As quatro chaminés poderiam representar os membros da banda, onde somente dois deles estão ativos, visto que Waters e Gilmour foram os únicos compositores do disco.

A fábrica representaria um matadouro e as chaminés são as patas para cima, entendendo-se a morte da sociedade. Várias são as análises que podem ser feitas na capa.

Preparamos essa playlist para você poder acompanhar as músicas descritas aqui no texto.

Embora muitos concluem que o porco voando sobre a fábrica seja uma referência à opressão, Roger Waters, em entrevista, afirmou que o porco é um símbolo de esperança, assim como a música que abre e fecha o disco: “pigs on the wing I e II”.

“… Wondering which of the buggers to blame
And watching for pigs on the wing”

“…Se perguntando qual dos vagabundos culpar
E observando os porcos em voo”
Pigs On The Wing 1 – Pink Floyd

“… Now that i’ve found somewhere safe to bury my bone
And any fool knows a dog needs a home
A shelter from pigs on the wing”

“…Agora que encontrei um lugar seguro para enterrar meu osso
E qualquer idiota sabe que um cão precisa de um lar
Um abrigo contra os porcos em voo”
Pigs On The Wing 2 – Pink Floyd

O álbum conceitual reduz a sociedade em três níveis de animais: Cães, ovelhas e porcos.

Os cães são retratados como pessoas sedentas pelo poder e que agem sem escrúpulos para chegarem ao ponto por elas determinado.

“You have to be trusted
By the people that you lie to
So that when they turn
Their backs on you
You’ll get the chance
To put the knife in”

“Você precisa ter a confiança
das pessoas para as quais você mente
Para que quando elas lhe virarem as costas
Você tenha a chance
de lhes enfiar a faca”
Dogs – Pink Floyd

Os porcos são os grandes donos do poder, são eles que comandam as peças e decidem quem deve morrer e viver. Demonstram clara contradição com o que falam e com seus atos.

“Big man, pig man
Ha, ha, charade you are
You well heeled big wheel
Ha, ha, charade you are
And when your hand is on your heart
You’re nearly a good laugh
Almost a joker
With your head down in the pig bin
Saying ‘keep on digging’
Pig stain on your fat chin
What do you hope to find
Down in the pig mine?
You’re nearly a laugh
You’re nearly a laugh
But you’re really a cry”

“Grande homem, homem porco, ha ha, farsante você é
Você uma pessoa muito importante, ha ha, farsante você é
E quando sua mão está sobre o teu coração
Você é quase uma boa risada
Quase um piadista
Com sua cabeça no chiqueiro
Dizendo: “Continue cavando”
Mancha de porco em seu queixo gordo
O que você espera encontrar?
Quando você está na sua mina de porco
Você é quase uma risada
Você é quase uma risada
Mas você é mesmo um lamento”
Pigs (Three Different Ones) – Pink Floyd

As ovelhas são descritas como a grande massa social, apenas sobrevivem dando frutos a seus superiores.

A mensagem deixada na música “Sheep” é para que as ovelhas não se contentem com os farelos deixados pelos porcos, pois se elas assim se mantiverem, vão terminar suas vidas em jaulas ou matadouros, como ovelhas pastoreadas por cães no campo.

“What do you get for pretending the danger’s not real
Meek and obedient you follow the leader
Down well trodden corridors into the valley of steel
What a surprise
The look of terminal shock in your eyes
Now things are really what they seem
No, this is no bad dream”

“O que você ganha fingindo que o perigo não é real?
Submisso e obediente você segue o líder
Descendo os corredores para o vale de aço
Mas que surpresa!
Um olhar chocado em teus olhos
Agora as coisas realmente são o que parecem
Não, isto não é nenhum pesadelo”
Sheep – Pink Floyd

1984

George Orwell

Se ‘A Revolução dos Bichos’ tem o Pink Floyd, ‘1984’, outro poderoso romance de George Orwell, tem David Bowie.

Seu oitavo álbum de estúdio “Diamond Dogs” é um trabalho híbrido entre o livro distópico e uma visão do próprio Bowie de um mundo “pós-apocalíptico”.

‘1984’ consegue ser muito mais chocante e assustador que ‘A revolução dos Bichos’, seu antecessor, talvez por isso tenha muito mais destaque e referências na cultura atual.

Big Brother
Olhos por todo lugar, vigiando cada movimento das pessoas. Inspiração direta do “Grande Irmão” de 1984, famoso romance de George Orwell

O livro se passa em uma sociedade totalitária onde toda e qualquer ação é vigiada pelo governo através do Grande Irmão, que sabe e vigia a todos do partido.

Ideias são controladas, o medo e o ódio são elementos do cotidiano, a comunicação é dissolvida por adaptações constantes no dicionário e a história é manipulada e editada diariamente, alterando o passado para comandar o futuro, como foi parafraseado pelo RAGE AGAINST THE MACHINE em Testify:

“Who controls the past controls the future
Who controls the present controls the past.”
“Quem controla o passado agora controla o futuro
Quem controla o presente agora controla o passado”
Testify – Rage Against The Machine

Em ‘Diamond Dogs’ duas músicas são referências à obra de Orwell.

George Orwell
O oitavo álbum de estúdio do inglês David Bowie conta com várias referências ao romance “1984”

Na canção “1984”, Bowie cita a constante lavagem cerebral feita pelo governo totalitário em seu povo:

“They’ll split your pretty cranium and fill it full of air
and tell that you’re eighty, but, brother, you won’t care
you’ll be shooting up on anything, tomorrow’s never there
beware the savage lure
of ninety eighty four”

“Eles vão dividir o seu belo crânio
E preenchê-lo de ar
E dizer que você tem oitenta anos
Mas irmão, você não se preocupa
Você será atira sobre qualquer coisa
O amanhã nunca chega
Cuidado com a mandíbula selvagem
De 1984″
1984 – David Bowie

Em “Big Brother” a referência ao poder máximo e sua influência em todo seu povo. Tudo ao Grande Irmão:

“Someone to claim us, someone to follow
someone to shame us, some brave apollo
someone to fool, someone like you
we want you, big brother”

“Alguém para reivindicarmos
Alguém para seguir
Alguém para nos envergonhar
Algum bravo Apollo
Alguém para nos enganar
Alguém como você
Nós te queremos, Grande Irmão
Grande Irmão”
Big Brother – David Bowie

Steve Wonder, fissurado pela obra de George Orwell também compôs e gravou uma canção de mesmo nome: “Big Brother”, exaltando a figura do Grande Irmão e reconhecendo-se insignificante perante o partido:

“Your name is big brother
You say that you’re watching me on the telly
Seeing me go nowhere
Your name is big brother
You say that you’re tired of me protesting
Children dying everyday
My name is nobody
But i can’t wait to see your face inside my door”
“Seu nome é grande irmão
Você diz que está me assistindo na televisão,
Vendo-me ir à lugar nenhum,
Seu nome é grande irmão,
Você diz que está cansado de eu protestando.
Crianças morrendo todos os dias,
Meu nome é ninguém
Mas eu não mal posso esperar para ver sua face do lado de dentro da porta”
Big Brother – Steve Wonder

Outra banda que dedicou um álbum inteiro para a obra de 1984 foi MUSE.

Muse
O álbum conceitual “The Resistance” dos ingleses do Muse traz os sentimentos do protagonista do romance “1984”

O disco “The Resistance” conta a trajetória do personagem principal do romance, Winston Smith.

• Suas Aflições;

“The paranoia is in bloom
the p.r. transmissions will resume
they’ll try to push drugs, keep us all dumbed down
and hope that we will never see the truth around, (so come on
)
Another promise, another scene, another
packaged lie to keep us trapped in greed with all the
green belts wrapped around our minds and endless
red tape to keep the truth confined, (so come on)”

“A paranoia está florescendo
As transmissões das relações públicas prosseguirão
Eles tentarão empurrar drogas que nos mantêm estúpidos
E esperar que nós nunca veremos a verdade ao redor (Então venha)
Outra promessa, outro cenário
Outra mentira embalada para nos manter presos em ganância
Com todos os “cintos verdes” amarrados em torno de nossas mentes
E a burocracia interminável para manter a verdade confinada (Então venha)”
Uprising – Muse

• Seus amores proibidos pelo Estado;

“Is our secret safe tonight
and are we out of sight
or will our world come tumbling down?
Will they find our hiding place
is this our last embrace
or will the walls start caving in?”


“if we live a life in fear
I’ll wait a thousand years
Just to see you smile again
Quell your prayers for love and peace
You’ll wake the thought police
We can’t hide the truth inside”
“Será que nosso segredo está seguro esta noite?
Nós estamos fora de vista?
Ou nosso mundo está desmoronando?
Será que descobriram nosso esconderijo?
Será esse nosso último abraço?
Ou será que as paredes começam a desmoronar?”

“Se vivermos a nossa vida com medo
Vou esperar mil anos
Só pra ver você sorrir novamente
Pare de orar para o amor e paz
Você vai despertará a polícia do pensamento
Podemos esconder a verdade pelo lado de dentro”
The Resistance – Muse

• O cansaço das guerras intermináveis;

“And these wars, they can’t be won
And these wars, they can’t be won
And do you want them to go on
And on and on
Why split these states
When there can be only one?
And must we do as we’re told?
Must we do as we’re told?”
“Essas guerras, elas não podem ser vencidas
Essas guerras, elas não podem ser vencidas
E você quer que elas continuem?
Porque dividir os estados?
Quando pode existir apenas um?
E devemos fazer como nos disseram?
Devemos fazer como nos disseram?”
United States Of Eurasia – Muse

Uma vez que você já não se reconhece como um ser capaz de ter seu próprio pensamento e decisões, o governo pode fazer com que você acredite em tudo, até mesmo que 2+2 seja igual a 5, nem que para isso seja preciso o uso da força.

“I’ll lay down the tracks
Sandbag and hide
January has april’s showers
And two and two always makes up five”
“Eu vou ajeitar os trilhos
os sacos de areia e me esconder
Janeiro tem chuvas de abril
e dois mais dois sempre é igual a cinco”
2+2=5 – Radiohead

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Distopia é aqui e agora

O pesadelo de sermos vigiados 24 horas por dia se dissolveu em tecnologias por nós adquiridas. Através de pixels, nós não temos medo de compartilhar infinitamente nossos dados. O que antes era intitulado como “distopia” hoje virou realidade por meio de um futuro ligando a comunicação e o entretenimento.

Enquanto a polícia de pensamento está se formulando, o grande irmão já está em atividade levando nossas informações para quem paga mais. Pois como George Orwell bem disse em determinado momento:

“A massa mantém a marca, a marca mantém a mídia e a mídia controla a massa”