Em meio a discussões de mesa de bar sobre o tal ‘feeling‘ da coisa, algo tem acontecido na última década

“Antigamente não tinha essa coisa de ficar estudando e tocando coisa difícil e era muito melhor que essa fritação aí”; “hoje em dia não tem mais feeling igual antes, aquela época que era boa”. Antes de mais nada, é válido salientar que esse é um texto de opinião pessoal vindo de uma pessoa que, digamos, procura se afastar o máximo do famoso saudosismo exemplificado logo acima. Uma visão de alguém que ama o Rock em quase todas as suas (infinitas) vertentes desde muito pequeno, e nunca se contentou com o que já conhecia. Sendo assim, um olhar deve ser lançado sobre essa já histórica ideia de que depois dos anos 1970 o Rock caiu em declínio, e nada mais foi tão interessante. Será?

Vivi a Copa do Mundo de 2002 com muito entusiasmo, se tornando para mim a melhor e mais emocionante de todas, enquanto milhões de outros brasileiros já não perdiam seu tempo com a Seleção desde a Copa de 1970. Os desenhos que assisti durante minha infância eram fantásticos, enquanto despertavam desprezo de todos os adultos ao meu redor que cresceram assistindo Jeannie é um Gênio, National Kid e Starsky e Hutch. Vê? Pois é. O saudosismo permeia muitos outros campos, por que haveria de ser diferente com o Rock?

Saudosismo
National Kid (60′) e Dragon Ball Z (90′ – 00′): ídolos de gerações distintas

Que nosso amado estilo teve seu boom nas décadas de 60’ e 70’ todos sabemos, mas pensar que nada de bom é produzido hoje é falta de informação ou pura canalhice mesmo. O Rock mudou, e mudou muito, sobretudo com o uso de novas tecnologias, justamente o ponto onde mais é criticado pelos saudosistas. Mas quem ousa dizer que Jimmy Page errou e jamais deveria ter levado um teremim para o palco? Pior, que Keith Emerson e Rick Wakeman estragaram o Rock levando sintetizadores de 2 metros de altura em suas apresentações.

Page e seu teremim

Porém, acredito que suas preces (ou melhor, reclamações) têm sido ouvidas, saudosistas, e uma onda de novas bandas que buscam um som cada vez mais tradicional tem tomado conta do cenário. Talvez o ápice tenha chegado com Greta Van Fleet, ótima e promissora banda que, em minha opinião, é o resultado de uma década de “volta às raízes” no estilo. The Temperance Movement, The Magpie Salute, Graveyard, Rival Sons (em minha opinião a melhor banda da atualidade), outras integradas por velhos figurões como Black Country Communion, The Dead Daisies, California Breed.

É muita coisa boa sendo feita, pautada em riffs mais tradicionais, mixagens intencionalmente cruas, músicas mais diretas e objetivas e músicos empunhando seus instrumentos sem pirotecnias ou pads eletrônicos com sons e efeitos que tanto parecem incomodar ouvidos com mais de 40 anos de vida auditiva. Outras trazem de volta algumas, por vezes todas, as marcas registradas do Southern norte americano, como Orango, El Cuero (a Noruega não é só Black Metal) e o incrível Blackberry Smoke, nos remetendo a Lynyrd Skynyrd e The Outlaws a todo momento.

“O saudosismo permeia muitos outros campos, por que haveria de ser diferente com o Rock?”

Enfim, estão todas aí, cabe a nós uma mínima boa vontade em procurá-las e deixar o saudosismo apenas para o futebol da Seleção brasileira.

Quando falamos em bandas de Rock nunca conhecemos tudo, mas também nunca gostamos do que não conhecemos. Da mesma forma que nem tudo feito hoje em dia me agrada, muitas bandas dos anos dourados também não conseguiram despertar meu interesse mesmo após algumas tentativas. É duro admitir que nem todas as bandas dos anos 70’ foram espetaculares, e com certeza dizer isso para aqueles que praticam o saudosismo é um crime. Mas deixemos isso para uma próxima oportunidade, o objetivo hoje é alertar: abramos os olhos para ótimos trabalhos que têm sido feitos enquanto apenas damos importância para coisas de 50 anos atrás, para que daqui 50 anos possamos olhar para trás e ter a certeza que aproveitamos esse grande momento da retomada da simplicidade e do tradicionalismo no Rock n’ Roll.